Atestado Histórico
Baduhenna, uma deusa da guerra pouco conhecida mencionada por Tácito em seus Anais, era venerada pelos Frisii, uma antiga tribo germânica do Mar do Norte. Embora seu nome apareça brevemente nos relatos históricos, ele oferece pistas sobre seu papel e importância na espiritualidade frisã, especialmente no contexto de batalhas e guerra psicológica.
A etimologia de Baduhenna revela muito sobre sua natureza. Seu nome parece derivar do proto-germânico badwa-, que significa “batalha” e está relacionado ao inglês antigo beadu (significando “batalha” ou “combate”). Esta raiz tem paralelo no proto-céltico bodwā-, de onde se origina o nome da deusa da guerra irlandesa Badb. Ambas as deusas estão ligadas à guerra, com ênfase em criar confusão e medo no campo de batalha. O segundo elemento do nome de Baduhenna, -henna, é menos claro, mas pode estar ligado ao sufixo -henae, presente nos nomes das deusas-mães germânicas ou Matronae. Isso sugere um aspecto protetor, possivelmente posicionando Baduhenna como uma guardiã de seu povo, especialmente em tempos de guerra. Este sufixo é uma chave para entender sua identidade, particularmente no contexto das deusas germânicas. Este elemento frequentemente aparece nos nomes das Matronae (plural Matronae ou Matres), divindades femininas invocadas em inscrições nos territórios romano e germânico. As Matronae eram reverenciadas como deusas protetoras e cuidadoras que presidiam sobre a fertilidade, o parto e os assuntos domésticos, mas também exerciam influência em aspectos de guerra e proteção.
O sufixo -henna provavelmente deriva de uma raiz proto-germânica ou proto-indo-europeia relacionada a mulheres, protetoras ou figuras femininas poderosas. Pode ser comparado ao sufixo -henae, visto nos nomes das Matronae em pedras votivas e altares dos séculos I ao V na região do Império Romano. Essas inscrições, encontradas em regiões como Germânia Inferior, Gália e Renânia, honram deusas-mães protetoras frequentemente representadas em trios, sugerindo que o sufixo poderia estar associado à fertilidade, proteção e soberania em combate.
Vale também mencionar Baudihille, um teônimo ou nome divino, inscrito em uma dedicação encontrada ao longo da Muralha de Adriano, que pode denotar uma deusa associada a Marte Thingsus, a versão romanizada do deus germânico Tiw (ou Týr). O nome Baudihille parece compartilhar conexões etimológicas com guerra ou batalha, semelhante a Baduhenna e Badb, alinhando-a com a tradição das divindades associadas à guerra. Considerando que os mercenários estacionados ali eram da mesma região onde se atesta o culto a Baduhenna, parece razoável afirmar que essa inscrição se refira à mesma deusa.
Em termos de simbologia, as referências ao bosque sagrado de Baduhenna sugerem uma forte ligação entre a deusa e a natureza, particularmente com as florestas selvagens e intocadas, onde se acreditava que forças divinas habitavam. Bosques eram frequentemente reverenciados como lugares sagrados nas tradições espirituais germânicas e indo-europeias mais amplas, representando espaços liminares onde o mundo divino e o mortal se encontram. O bosque de Baduhenna, cenário de um massacre em 28 d.C., simboliza um lugar de poder onde as fronteiras entre ordem e caos se misturam. Ali, os Frisii emboscaram e mataram 900 soldados romanos. O caos que se instalou entre as forças romanas—onde os soldados supostamente se voltaram uns contra os outros—sugere que a influência de Baduhenna poderia ter se estendido além da guerra física para o domínio psicológico.
Essa manipulação psicológica encontra paralelo nos poderes da deusa da guerra irlandesa Badb, que está associada à confusão e ao terror no campo de batalha. Na tradição celta, Badb frequentemente assume a forma de um corvo, aparecendo antes ou durante a batalha para incitar medo e caos entre os soldados inimigos. Seu poder reside em mudar o rumo da batalha por meio da guerra mental, criando um ambiente de confusão e desordem. Isso é refletido nas consequências da Batalha do Bosque de Baduhenna, onde os soldados romanos, desorientados e em pânico, mergulharam no caos, levando à sua destruição final. A habilidade de Baduhenna de incitar confusão a alinha com divindades como Badb, cujos poderes transcendem o combate físico e influenciam o estado psicológico dos guerreiros.
A sobreposição temática entre Baduhenna e Badb sugere que elas podem ser reflexos de um arquétipo de deusa da guerra proto-indo-europeia compartilhado. Ambas estão associadas à batalha, confusão e morte, e ambas exercem poder sobre as mentes dos guerreiros. Enquanto Badb opera na forma de um corvo na mitologia celta, a influência de Baduhenna é mais sutil, ligada ao espaço sagrado de seu bosque, onde confusão e traição se manifestam nas ações daqueles que o adentram. Essa conexão conceitual é fortalecida pelas ligações etimológicas entre o proto-céltico bodwā- e o proto-germânico badwa-, ambos significando “batalha” ou “guerra”, enfatizando seu patrimônio indo-europeu compartilhado.
Interpretação do Papel da Deusa
Para os pagãos germânicos modernos, Baduhenna representa um aspecto importante, embora muitas vezes esquecido, do divino na guerra. Enquanto figuras como Woden e Tiwaz podem ser vistos como deuses do combate direto, Baduhenna governa o reino menos tangível, mas igualmente decisivo, da guerra psicológica. Sua presença pode ser invocada não apenas para a vitória em conflitos físicos, mas também para a habilidade de desorientar e superar adversários por meio de estratégia e astúcia. Ao reconstruir seu papel ao lado de outras divindades germânicas e indo-europeias, os praticantes podem se reconectar com uma deusa cuja influência moldou o destino dos guerreiros há muito tempo.
Assim, Baduhenna nos lembra que nem todas as batalhas são travadas com espadas e lanças—algumas são vencidas nas mentes daqueles que lutam.
Notas de rodapé
1 White, M. E., & Walker, B. (1956). The Annals of Tacitus. Phoenix, 10(2), 80. https://doi.org/10.2307/1086443
2 https://en.wikipedia.org/wiki/Badb
3 https://symbolsage.com/badb-celtic-war-goddess/
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