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Frau Holle, a grande deusa Germânica



 Introdução


Nosso estudo parte da montanha  Kyffhäuser, é uma cordilheira na Alemanha Central , compartilhada pela Turíngia e Saxônia-Anhalt , a sudeste das montanhas Harz . Atinge seu ponto mais alto no Kulpenberg com uma elevação de 473,4 metros.

A cordilheira é o local do Castelo medieval de Kyffhausen e do Monumento Kyffhäuser do século XIX; tem significado na mitologia tradicional alemã como o lendário local de descanso do imperador Frederico Barbarossa

. Segundo a lenda, o imperador Barbarossa, que morreu em uma cruzada, dorme dentro da montanha, mas acordará um dia, salvará o império e o conduzirá a uma nova glória. De acordo com o antigo conto de fadas registrado pelos Irmãos Grimm, “ele então pendurou seu escudo em uma árvore estéril, que florescerá novamente e um tempo melhor chegará.”

No entanto, descobertas muito mais antigas e fascinantes foram feitas nas proximidades na década de 1950. Talvez eles sejam até o ponto de partida da lenda de alguém dormindo na montanha….

Na encosta ocidental íngreme um pico secundário do Kyffhäusergebirge, o Kosackenberg, existe um sistema de cavernas e fendas interconectadas que sobe em uma fenda vazia de 15 metros de altura onde foram encontradas diversas oferendas.

Os achados mais notáveis ​​datam, no entanto, principalmente da Idade do Bronze e do início da Idade do Ferro, período chamado de Urnfield e Hallstatt, entre 1.200 e 1.000 aC. Além de utensílios de cerâmica e pedra, restos de grãos torrados, caixas de casca de bétula e espirais, foram encontrados numerosos ossos humanos com vestígios de cortes e queimaduras, cuja contextualização sugere que as vítimas jovens foram vítimas de canibalismo ritual.

Segundo Prof. Günter Behm-Blancke, os predecessores das tribos germânicas da região, os ilírios, teriam feito sacrifícios aqui a uma deusa ctônica da fertilidade. Isso pode ser concluído, entre outras coisas, a partir de um verticilo de madeira, que foi encontrado no local. Tal objeto já foi o “símbolo da lã e do destino fiando divindades do submundo”, e pode aqui se referir à deusa da fertilidade, em cuja habitação subterrânea cavernas sagradas, lagos e pântanos levavam.

Esses ilírios mais tarde se tornaram parte dos celtas e das tribos germânicas. A antiga deusa-mãe ilíria era semelhante à deusa germânica e, portanto, pode-se supor que a deusa - mais tarde provavelmente sob outro nome - também foi adorada mais tarde na região, por exemplo na charneca sacrificial perto da famosa Oberdorla, onde um grande ídolo feminino com um colar de bronze foi encontrado.


Hulda

 
Frau Holle, também conhecidas por muitos outros nomes como Herke, Perchta, Freyja, Frigg, Esposa de Wodan, Holda, Holl, Hulda e Hel, isso mesmo, mas acalme-se meu caro leitor que irei te explicar cada detalhe com calma e devida profundidade que o assunto exige.

Hulda é o segredo, aquilo que está oculto, coberto, está associado às plantas perenes que sobrevivem ao frio inverno, e quando a neve cai as lendas nos contam que é Frau Hulda sacudindo seus travesseiros de penas de ganso, poético não acham ?, Frau Holda está associada a florestas e plantas, e tudo aquilo que cresce da terra, sendo ela a personificação da própria terra, Hulda é a terra, a rainha de tudo aquilo que está abaixo de nossos pés.

Hulda e Hel

Hulda está profundamente ligada com a morte e o reino dos mortos, e assim como os mortos ela também propicia fertilidade a terra, sendo ela a Deusa do renascimento, Holda é a Deusa mãe primordial do subsolo, a senhora da morte, iniciação e renascimento, o que traz muitas semelhanças entre Holda/Hulda com Hel, a deusa escandinava dos mortos, Helja em germânico, que significa mundo subterrâneo, uma palavra que traz a ideia de ocultação,  não na comum interpretação de outro mundo, outro lugar, mas sim como abaixo da terra, sob o solo, enterrado e escondido, o que se reflete em muitos outros termos escandinavos, como a Huldra, um ser mitológico escandinavo que possuía a aparência muito bela mas escondia em suas costas um buraco oco como de uma árvore, se atente a esse detalhe, ele será melhor explorado em breve, ou as lendas Islandesas sobre o Huldufólk, o povo invisível, que em diversas crenças estão associadas a elfos e os montes tumulares, sendo todas essas representações associadas a morte, fertilidade, renascimento.


todas essas representações e essa gama de seres mágicos como as fadas e o Huldufólk vem da crença de que os espíritos dos ancestrais depois de sepultados nos montes tumulares, depois de um período, eram transformados nesses seres, sendo esse o papel do mundo subterrâneo e principalmente o papel de Hulda, transformar os espíritos dos mortos em um novo ser, tornando assim Hulda a deusa dos mortos, a personificação dessa transformação, a rainha do mundo subterrâneo.

outro ponto em comum, é a forma em que representam Hel sendo meio cadavérica, partindo do entendimento de que essa representação pode ter sido uma tentativa de demonizar a deusa Hel e a torná-la mais semelhante a Praga, e tendo como base dessa afirmação a edda escrita por Snorri, onde ele retrata Hel sendo metade branca e metade negra, conseguimos fazer mais um grande paralelo entre Hulda e Hel, quando analisamos essa afirmação, já que a cor branca nos países nórdicos representa a cor pálida de um cadáver e a cor negra representa o solo fertil, sendo essa crença de dualidade refletida também na criatura mágica conhecida como Huldra, que frontalmente representa uma bela e jovem mulher e nas suas costas usa o longo cabelo para esconder um buraco oco em seu corpo, e Hulda, que vezes aparece representada como uma jovem e bela mulher e às vezes como uma velha assustadora.


Holda e sua ligação com a bruxaria

No  século X os francos iniciaram uma campanha de difamação contra crenças ditas como diabólicas e mulheres más, afirmando que tais mulheres voariam sobre o céu noturno com Diana, e posteriormente com Heródia, a primeira bruxa, e que a partir daí fariam seus malefícios e se dirigiriam ao seu sabbat, porém para os povos do norte houve uma associação diferente, e esse papel de líder das bruxas coube a Holda.


É registrado em diversos textos medievais que Holda liderava uma hoste de espíritos, feiticeiras e criaturas malignas nas noites que compreendia o período de samhain até o yule, que eram justamente os períodos mais escuro do ano para os países nórdicos, sendo essa uma tentativa que acabar com os cultos de fertilidade e as divindades femininas.

Porém na Alemanha durante o século XIII houve um movimento que afastou Holda dessa imagem de senhora das bruxas e da sua função original de deusa da morte e a aproximou mais de Santa Maria, o que com o tempo acabou mudando o aspecto das duas divindades, dando a Hell uma imagem maior de figura demoníaca e a Holda uma imagem mais cristianizada.


Hulda e Kolyo, a Caçada Selvagem (Heljagd)

a caçada selvagem é um evento que ocorre nos períodos invernais do norte europeu, acredita-se que durante essas tempestades hostes de espíritos cruzam o céu em perseguição de almas pelo mundo dos vivos, por mais que muitas fontes hoje relatam que seja Wodan o líder da caçada selvagem, em muitos lugares até os dias de hoje em vários lugares da alemanha contam que quem lidera a caçada seja Holda, sendo popularmente chamada de Heljagd ( Hel = morte Jagd = caça).


Essa crença de que Holda lidera a caçada selvagem se mostra ser muito antiga e provavelmente remete a períodos mais antigos, antes mesmo de deuses como Wodan, Donnar e outros serem introduzidos na Germania.

Hulda vem de Kolyo, acredita-se que seja uma deusa da morte indo-europeia, cujo nome significa proteger, esconder, aquela que cobre, esconde, sempre seguindo essa ideia de ocultação da qual falamos durante todo o texto.

A aparência de Kolyo é dita como a personificação das emoções relacionadas à morte, tanto fascinação quanto horror, Kolyo é dita como muito bela e sedutora, quando vista de frente, mas quando vista de costas era repulsiva, isso não lembra nos remete apenas a Hel como também a Huldra, que usa seu longo cabelo para esconder suas costas repulsivas.

Muitas vezes esse buraco nas costas da Huldra é descrito como um buraco de uma árvore, o que nos lembra cavernas, os buracos onde os corpos eram sepultados, ocultados e também eram os principais locais de culto da antiga mãe terra, um lugar dentro da terra, no escuro, o mundo subterrâneo.


Hulda e a Terra

Para os escandinavos, Hulda é descrita como Hlódyn, a mãe do deus Thor, ela também é conhecida como Jord, a própria terra, e como vimos anteriormente, Frau Holda está ligada a terra, a fertilidade e a queda de neve, sendo assim  de estação a estação associada a nevasca, que cobre a terra e traz a morte.

  É dito que quando ela sacode seus travesseiros as penas de ganso caem, e assim a neve vem ao nosso mundo, essa ideia das penas caindo não serve apenas para simbolizar os flocos de neve mas também coincide com a migração desses pássaros antes da neve chegar.


O ganso é o pássaro sagrado de Frau Holda, e também está associado à caçada selvagem, sendo seu coaxar noturno associado aos uivos fantasmagóricos de lobos, relinchos de cavalos e outros sons da caçada selvagem.

Dentro do xamanismo do ártico, o animal guia para adentrar no submundo não era o cavalo, esse papel cabia ao ganso, sendo assim o xamanismo do ártico o maior repositório de conhecimento pagão antigo, onde o cavalo tem pouco significado espiritual, os povos Sami por exemplo, tem essa papel ligado ao alce e ao ganso, mas não ao cavalo, não apenas por ser um animal símbolo e muito adorado pelos seus vizinhos nórdicos, que os atacavam rotineiramente, mas também por ser o animal símbolo do violento culto de Odinn, onde com o tempo a figura de Odinn se misturou com a figura do deus sami conhecido como Ruto.

Sendo assim o ganso o animal que o xamã viajaria para o mundo subterrâneo, o animal símbolo de Hulda, a rainha do mundo subterrâneo, a mãe terra guardiã dos mortos, a que envolve e protege os mortos, a figura materna que protege seus filhos em seu ventre terreno após a morte.

O que nos remete a muitas similaridades com a deusa registrada por Tácito como Nerthus, a deusa da terra, que viajava em uma carruagem com seu rosto oculto e tendo seus locais de adoração ligados a pântanos.

Nos revelando assim que certamente Holda é uma deusa muito antiga, provavelmente de origem PIE, se fundindo a imagem de uma possível grande divindade feminina, que com o tempo devido aos acontecimentos da época se dividiu em diversas outras divindades, porem mantendo em cada uma delas a sua essência, a grande mãe terra, que alimenta, abriga e recebe seus filhos após a morte, os transformando para a nova jornada cheia de mistérios e segredos ocultos no mundo subterrâneo.

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